APONTAMENTOS SOBRE A IMPORTÂNCIA DA TUTELA PENAL DO AMBIENTE

Resumo

O trabalho tem por propósito, no seio de uma pesquisa teórica que se utiliza de procedimentos discursivos e argumentativos, tecer comentários sobre a Lei Penal Ambiental no contexto do artigo 225 da Constituição da República Federativa do Brasil, de forma a confirmar, após a análise do bem jurídico ambiental, da intervenção mínima do Direito Penal, das normas penais ambientais e da responsabilização da pessoa jurídica, a hipótese de que, não obstante as dificuldades dogmáticas para a adequação do direito penal à proteção de bem jurídico difuso, a tutela penal do meio ambiente é de suma importância para a preservação da natureza.

Palavras-chave: Meio Ambiente; Tutela Penal; Intervenção Mínima; Necessidade de Proteção.

Abstract

The work has the purpose, within a theoretical research that uses discursive and argumentative procedures, to comment on the Environmental Criminal Law in context of article 225 of the Constitution of Federative Republic of Brazil, in order to confirm , after the analysis of the environmental legal interest, of minimum intervention of criminal law, environmental criminal law and accountability of the legal entity , the hypothesis that, despite the dogmatic difficulties to the adequacy of criminal law to diffuse legal asset protection, criminal protection of the environment is of paramount importance for preservation of nature.

Keywords: Environment; Criminal Protection; Minimal Intervention; Need to Protect.

1 – INTRODUÇÃO

O meio ambiente, não obstante já tutelado por normas de cunho administrativo, carece, principalmente diante de ações humanas que trazem de forma subjacente uma desenfreada necessidade da conquista da natureza para a realização econômica de seus desejos, de uma proteção penal que permita o aproveitamento racional dos recursos naturais, com vistas à sua permanência no tempo e à proteção das gerações futuras.

O direito penal, considerado que é pela população em geral como aquele dotado de uma menor indulgência quanto às respostas que apresenta ao autor de delito, traz consigo a esperança de que a sua intervenção seja capaz de frear os constantes e incisivos ataques humanos à natureza. Todavia, diuturnamente nos deparamos com o noticiário nacional, escrito, falado e televisivo que traz em suas mensagens diretas e subliminares, reportagens que retratam o dia-a-dia da sociedade e que culminam, por vezes, com insinuações de que a lei, e também a lei penal, não funciona nesse país.

As mensagens às quais nos referimos dizem respeito às páginas políticas e policiais. Em tom jocoso, a maioria das reportagens dizem que se as penas fossem aumentadas, se a maioridade penal fosse revisada, se o criminoso preso cumprisse a integridade da sua pena em regime fechado, se o buraco da estrada fosse por ele tapado ou mesmo se o pelourinho fosse efetivamente restaurado, a sociedade seria melhor.

O mundo em que vivemos está suspenso no universo há alguns bilhões de anos. Assiste-se a uma desenfreada cadeia consumista que nos leva a gastar mais do que a capacidade que temos de produzir, sem nos preocuparmos com os riscos dessa ganância. No passado, os riscos advinham, sobretudo, de fenômenos naturais. Hoje, todavia, eles têm origem na própria ação ou omissão humana. Ganância e poder se sobrepõem à preocupação de mantermos, em dignas condições, uma natureza capaz de proporcionar condições de vida ao próprio homem. Assim é que, segundo dados da ONU, a fome já atinge mais de 1 bilhão de pessoas, 25% delas na África.

A exploração do planeta na velocidade em que se encontra, com as reservas se esgotando, principalmente no que concerne à água potável, indica que não teremos, em curto espaço de tempo (100 anos ou menos!) área para agricultura, ar para respirar. Soa catastrófica a realidade e, verdadeiramente, ela o é.

Urge, por isso, envidar esforços para a proteção ambiental. Meio Ambiente, o bem jurídico a ser efetivamente tutelado. Contudo, em se tratando de ramo jurídico fragmentário e subsidiário e construído para a tutela de bens jurídicos de raízes individualistas, pergunta-se: a tutela do ambiente pelo direito penal é necessária e possível?

Se partirmos da premissa de que o direito administrativo sancionador, por mais presente que esteja em nosso dia-a-dia, já não mais alcança o indivíduo a ponto de intimidá-lo a não praticar condutas lesivas ao ambiente, o legislador infraconstitucional, seguindo tendências internacionais, agiu bem ao criminalizar ações ou omissões, com vistas a fechar o cerco contra o infrator que danifica o meio ambiente. E assim o fez, atendendo ao comando incriminador (válido para as pessoas físicas e jurídicas) previsto no artigo 225, § 3º, da Constituição Federal, com o interesse voltado para o mais precioso bem da humanidade, a vida, digna e saudável, tutelada constitucionalmente; aquela, querida por todos.

Dificuldades de ordem de confecção do tipo penal, principalmente de forma a evitar uma indeterminação do conteúdo proibitivo, a responsabilidade das pessoas coletivas e a inefetividade da norma penal, principalmente se presente estiver uma inflação legislativa que não reproduza o caráter de ultima ratio do direito penal, são obstáculos a serem vencidos, pois, afinal, o direito, e assim também o direito penal, é quem deve servir a vida e não o contrário. Tal como defendido por Hernández Pozo (2014, online),

es claro, que tanto el legislador como el constituyente quisieron asegurarse de proporcionarle al ambiente todas la posibilidades para su salvaguarda, incluyendo las que otorga el Derecho Penal, no siendo óbice para ello su carácter de última ratio. Al otorgarle el carácter de bien jurídico al ambiente, se le está individualizando, de manera de deslindarlo de cualquier otro bien jurídico. Y esto es así, al punto de constituir la mayoría de los delitos ambientales delitos complejos o pluriofensivos, donde se ven vulnerados más de un bien jurídico: el ambiente en todo caso, y otros, generalmente, la salud (como en el caso de contaminación de aguas), la vida (como en el caso de desechos peligrosos) o la propiedad (como en el caso de incendio de vegetación cultivada). El ambiente adquiere así un valor per. se, independientemente del valor económico del objeto jurídico amenazado o vulnerado.

O método teórico empreendido, que não prescindiu de busca de informações em julgados de tribunais superiores e de pesquisa em textos nacionais e estrangeiros, aborda aspectos relativos à norma penal ambiental, à intervenção mínima do direito penal e à responsabilidade penal da pessoa jurídica. Todavia, a pesquisa não tem por propósito aprofundar nesses aspectos, senão trazer, a partir deles e à luz do marco teórico de Hernández Pozo, retrocitado, argumentos que traduzem a importância da proteção penal do meio ambiente.

2 – A CRIMINALIZAÇÃO DO DANO AMBIENTAL

Nenhum ser humano responsável tem qualquer dúvida sobre o dano capaz de ser gerado pela destruição do meio ambiente. Melhor dizendo: todos nós temos consciência de que é preciso proteger o meio ambiente. Por tal razão, durante a elaboração da vigente Carta Magna, o legislador constituinte externou o direito do povo brasileiro “a um meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida” (art. 225, caput).

A promulgação da Constituição, em 1988, trouxe consigo a positivação da matéria, traduzindo a necessidade de se incorporar e amalgamar no seio da sociedade o meio ambiente equilibrado, reservar o seu gozo e preservá-lo para as futuras gerações. Mas a Constituição não parou por aí, já que, no artigo 225, § 3º, ela trouxe o comando criminalizador de ações, de pessoas físicas e jurídicas, que contrariem o sentido expresso no texto constitucional.

Bastaria, com tal referência, uma vez que a Constituição inaugura e constitui a ordem jurídica, dizer que a criminalização do dano ambiental se impõe porque a Carta Magna assim o determina. Mas qual a razão disso?

Vivemos em uma sociedade de risco, assim considerada nos moldes de Beck (2010). Esse risco, no entanto, não é recente, valendo aqui destacar, consoante Pedro Braga (2014, online), que hoje “o risco ampliou sua natureza e adquiriu novas facetas. Mudou, ou melhor, adaptou-se, em uma sociedade mais complexa”.

De mero caso fortuito, atribuído a fatos da natureza, leciona o referido autor que

em meados do século XVII na Europa, já na sociedade moderna, a explicação do mal-estar no mundo (tema depois tratado por Freud) centrava-se em argumentos religiosos e mágicos. No século XVIII, surgem as soluções científicas no bojo da produção industrial, emergindo, do ponto de vista político, o sistema liberal, em que o risco tecnológico é distribuído de maneira desigualmente a população.O risco entra na esfera do jurídico pelo viés da responsabilidade civil e penal, após os contratos de seguro, inicialmente marítimos, que são uma forma mais antiga de precaver-se contra os danos resultantes de riscos potenciais. Os juristas debruçam-se sobre a explicação científica das causas do dano, do nexo de causalidade. Intervém uma transformação na cultura do risco, ligada à questão do destino coletivo (BRAGA, 2014, online).

Bottini (2010), por sua vez, dispõe, também nos moldes do clássico “La sociedad del riesgo”, que a sociedade de risco é fruto do desenvolvimento do modelo econômico surgido na Revolução Industrial, que organiza a produção de bens por meio de um sistema de livre concorrência mercadológica (BOTTINI, 2010, p. 31-35).

Nessa vertente, dispõe o autor paulista ser imprescindível o estudo do risco e das modalidades de geri-lo e controlá-lo para identificar os contornos do direito penal contemporâneo. Afinal,

a elucidação da problemática sobre a legitimidade do direito penal da precaução exige que sejam tecidas considerações sobre os instrumentos desenvolvidos pela sociedade para lidar com o paradoxo do risco, que serão os pilares sobre os quais se postam as novidades do discurso do direito criminal” (BOTTINI, 2010 p. 51).

Observa-se, assim, que o risco, estampado em condutas humanas capazes de gerar grandes catástrofes ambientais, não pode ser subtraído do campo de esfera do direito penal e, via de cosequencia, da órbita de ação da norma penal ambiental.

Uma vez que “as normas constitucionais assumiram a consciência de que o direito à vida, como matriz de todos dos demais direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as normas de atuação no campo da tutela do meio ambiente” (SILVA, 2009 p. 849), não há como retirar o ambiente da esfera de proteção do direito penal.

Da leitura do art. 225 da Constituição, pode-se assegurar que o constituinte brasileiro quis, traduzida a aspiração e o clamor da sociedade, responder juridicamente as agressões às quais estava exposto o ambiente. A inovação está no § 3º, que determina, de forma estreita, a cominação de sanções penais e administrativas, sujeitando a elas tanto pessoas físicas, quanto jurídicas, que eventualmente causem lesão ao bem jurídico protegido.

Estando, pois, criminalizado o dano ambiental, qual seria, no entanto, o modelo ideal de proteção legal? Deveria estar em leis específicas ou se incorporar ao Código Penal? Seguindo a advertência de Prado de que “a moderna tendência doutrinária e legislativa sugere, corretamente, como alternativa preferível a da integração dos tipos penais do ambiente no Código Penal, como bens jurídicos autônomos” (2009, p. 77), foram consultados arquivos do Senado Federal sobre o anteprojeto do Código Penal, e nos deparamos com a inserção do tema ambiental. Na versão consultada1, disponível no site do Senado Federal, foi possível observar o Título XV – DOS CRIMES METAINDIVIDUAIS, no qual estão insertos os artigos 405 a 441 que tratam do tema ambiental especificamente. Assim, os temas tratados em lei especial, como, no caso ambiental, a Lei 9605/98, passam a integrar a esfera do Direito Penal codificado, o que reflete o relevo que o tema tem hoje a ponto de ser tratado na lei penal mais densa e relevante do país, o Código Penal.

Entendida como Lei dos Crimes Ambientais, na verdade considerada como instrumento híbrido, já que se preocupou também de infrações administrativas, a Lei 9605/98tem a sua importância e reflete as preocupações modernas do legislador quanto às questões ambientais, mesmo porque, em nível penal, ela representou a dação de “efetividade ao ideário constitucional de apenar as condutas lesivas ao meio ambiente e atendeu a recomendações insertas na Carta da Terra e na Agenda 21” (MILARÉ, 2011 p. 1305).

É claro que há passos largos a serem dados no sentido da proteção ao meio ambiente como bem de todos, mesmo porque, dada a relevância do tema, ele não prescinde de uma maior e melhor preocupação do próprio legislador no trato da matéria, haja vista que somente agora os olhos se voltaram para a inserção do tema no seio do Código Penal. Todavia, é de se reconhecer que a Lei 9605/98 e as preocupações para a inserção da matéria ambiental no Código Penal já revelam ser dignas dos mais elevados encômios, afinal, como discorre Pozo (2014, online), referindo-se à realidade de Cuba,

en muchos países (incluido el nuestro) estos delitos se encuentran todavía en los títulos correspondientes a los “delitos contra la seguridad pública” ,en los “delitos contra la economía” o en los delitos contra la vida y la integridad corporal. De esta manera, el delito ambiental, entendiendo por tal en mi criterio, la acción típica, antijurídica y culpable o violatoria de disposiciones, dirigida a trastornar nocivamente el ambiente, desmejorando la calidad de la vida y merecedora de una sanción penal, era hasta ahora, sólo una creación doctrinal. Esto, porque hasta hace muy poco tiempo, la naturaleza era sólo considerada como telón de fondo de la actividad humana y no como algo valioso jurídicamente por sí mismo.

3 – NORMA PENAL AMBIENTAL

Ao observarmos o espectro de leis brasileiras que tratam o tema relativo à tutela do meio ambiente, encontramos um cipoal de regulamentos, leis e decretos que, em âmbito penal, foi absorvido pela Lei 9605/98.

Notadamente, o meio ambiente era protegido no Brasil desde os tempos do Brasil Colônia. A necessidade da Coroa Portuguesa pelas riquezas naturais impunha, de alguma forma, regras para a exploração de madeira, principalmente o pau-brasil, cuja extração só poderia ser feita com licença para tal.

Na República, a primeira Constituição, de 1891, em seu art. 34, inc. 29, falava sobre a competência da União para legislar sobre terras e minas, o que poderia ser indicativo de regulação ambiental. O referido artigo foi modificado em 1929. O Código Civil de 1916 trazia no Direito de Vizinhança (arts. 554 e 555) repressão ao uso nocivo da propriedade. Por sua vez, o Código Florestal, o Código da Caça e o da Pesca também traziam, de certa forma, textos que incluíam proteção e sanção.

Já em 1981, a Lei 6.938, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, fixou regras de proteção e uso dos recursos ambientais, seguindo os movimentos mundiais de proteção ao meio ambiente, advindas da Convenção das Nações Unidas de 1972, que tratava do desenvolvimento sustentável.

Com a Constituição de 1988, o art. 225 vem selar a autoridade constitucional sobre a legislação ambiental brasileira. Anteriores e posteriores à Constituição, poder-se-ia distinguir leis importantes com conteúdo de proteção ambiental, que, inobstante a pouca efetividade, colocavam o Brasil num lugar destacado dentre aqueles dotados de legislação ambiental moderna. Contudo, o Brasil não se encontrava a salvo de críticas:

O grande problema é que o Estado brasileiro ainda não tem compromisso real com o meio ambiente, mas esse é o desafio que todos, ou seja, a coletividade deste Brasil tem que enfrentar, pois é o dever de todos pleitear um meio ambiente ecologicamente equilibrado (COSTA, 2013 p. 119).

As regras administrativas protetoras do meio ambiente, com o advento da Lei 6.938/81, não tinham tanta eficácia e havia um clamor, pós 1988, para a edição de normas mais claras que introduzissem sanções penais, na esteira do §3º do art. 225 da Constituição. Em termos práticos, somente com a Lei 9.605/98 é que o tema foi assentado.

Todavia, como esclarece Bottini (2010), “a legislação criminal sofre as primeiras influências da insegurança social perante as novas tecnologias e altera seus dispositivos de acordo com o sentido das demandas pela maior ou menor restrição dos riscos” (BOTTINI, 2010, p. 111), o que proporciona, na contramão dos postulados tradicionais do direito penal, a criação de tipos penais que inibem condutas cuja periculosidade é meramente indiciária, cujos riscos não são evidentes, mas apenas suspeitos.

A grande demanda pela intervenção penal, marcadamente em face da caracterizada por Silva Sánchez como sociedade de objetiva insegurança (2011, p. 37)2, acaba por revelar, na configuração da norma penal, uma certa fuga à secular característica de taxatividade e uma consequente maior permissividade à confecção de normas com conteúdos proibitivos mais abertos, sujeitos à acessoriedade administrativa destacada em face do caráter difuso do bem jurídico tutelado. A maior demanda por direito penal acaba por proporcionar um movimento expansionista que, na Espanha, ocorreu em 1995 e que foi alvo das seguintes considerações de autores ibéricos:

Tal expansão é, por certo, uma característica inegável do Código Penal espanhol de 1995, e a valoração positiva que importantes setores doutrinários têm realizado sobre o mesmo deixa patente como a tópica fuga (seletiva) ao Direito Penal não é apenas um problema de legisladores superficiais e frívolos, mas que começa a ter uma cobertura ideológica de que carecia até pouco tempo. Em todo o caso, o legislador de 1995, de fato, não pôde subtrair-se nem sequer a um reconhecimento expresso – ainda que parcial – desse fenômeno, ao aludir na Exposição de Motivos do texto legal à existência de uma ‘antinomia entre o princípio da intervenção mínima e as crescentes necessidades de tutela em uma sociedade cada vez mais complexa’, antinomia que se resolveria no texto, segundo o próprio legislador, ‘dando prudente acolhida a novas formas de delinquência, mas eliminando, ao mesmo tempo, figuras delitivas que perderam sua razão de ser’ (SILVA SÁNCHEZ, 2011, p. 28).

No Brasil, o movimento expansionista também não ficou a salvo de críticas, sendo que a norma penal ambiental recebeu de Luiz Régis Prado (2009) a genérica classificação de prolixas, casuísticas, tecnicamente imperfeitas, quase sempre inspiradas por especialistas do setor afetado, leigos em Direito, ou quando muito de formação jurídica não específica, tornando-as de difícil aplicação (PRADO, 2009 p. 81).

Noutra senda, Edis Milaré (2011) aponta avanços no ordenamento jurídico ambiental com o advento da Lei 9.605/98, pelo tratamento sistêmico da tutela penal nela contido. Aduz, como destaque, a inclusão de tipos culposos e a adoção de penas restritivas de direito, o que favorece o papel dos aplicadores da lei (agentes ambientais, polícia, Ministério Público e Poder Judiciário). Segundo o autor, a lei possibilitou a construção de uma doutrina e jurisprudência adultas, aptas a consolidar as posições mais certas e as interpretações mais razoáveis (MILARÉ, 2011, p. 1318).

Observa-se, portanto, que a preocupação que permeia os estudiosos do tema está no uso da técnica legislativa, que, a um só tempo, deve contemplar a proteção ambiental e, por se tratar de norma penal, não fugir aos seus postulados tradicionais, seculares. Como definir os precisos limites do equilíbrio não é, no entanto, tarefa fácil. Destaca Figueiredo Dias, contudo, que cumpre ao Direito Penal uma especial função nas novas demandas sociais, nas quais se inserem a defesa do meio ambiente. Afinal, como externa o respeitado Professor de Coimbra, a

multiplicidade de condutas perigosas para as condições fundamentais de vida das gerações futuras, na complexidade que podem chegar a assumir e na constante modificação a que, por força da evolução tecnológica, estão submetidas, conduz efectivamente a que os delitos colectivos, como quer que em definitivo tipicamente se construam, se encontrem submetidos a uma cláusula de acessoriedade administrativa. O que vale por dizer que o conteúdo integral do ilícito só pode revelar-se, em última análise, também em função de normas sem dignidade penal. A acessoriedade administrativa suscita à dogmática jurídico-penal, é verdade, um longo cortejo de problemas, para alguns dos quais ainda mal se divisam hoje soluções consensuais. Mas também neste ponto seria salutar começar por assentar numa tão antiga, como boa verdade: a de que não são as valorações político-criminais que devem subordinar-se ao labor (e às dificuldades, e às limitações em cada momento histórico) da dogmática e ser por ele condicionadas, antes sim é a dogmática, como puro meio construtivo-instrumental, que tem de servir as proposições político-criminais e a elas se adequar. (DIAS, 2014, online).

Todavia, o complemento administrativo a normas de cunho incompleto que são características da tutela penal ambiental e que, no Brasil, na Lei 9605/98, são encontradas em boa parte dos tipos penais (a exemplo dos artigos 29, § 4º, I e IV; 34, caput e parágrafo único, I e II, 35, I e II, 36, 37, IV, 38, 45, 50, 42, 56, 62, I), se fazem necessárias na medida em que, estando bem delimitado o conteúdo do ilícito, elas se prestem a apenas configurar típicas condutas que dependam, pela característica do bem jurídico tutelado, de certos contornos administrativos. Afinal, continuar na esfera do desrespeito, seja pela ignorância da sociedade, seja pela leniência do Estado e de seus governantes, na contínua degradação do meio ambiente é o que não se deve permitir.

4 – RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL

O Direito Penal considera o homem natural um ser livre, inteligente e sensível; a pessoa jurídica, ao contrário, encontra-se despojada dessas características, sendo um ser abstrato. Nessa ordem, os delitos que podem ser imputados também à pessoa jurídica são praticados sempre por seus membros ou diretores, pessoas naturais, pouco importando que o interesse da corporação tenha servido de motivo ou de fim para sua prática. (PRADO, 2009, p.119)

Sendo o sujeito ativo, nos crimes ambientais, qualquer pessoa, física ou jurídica, há, portanto, que se distinguir entre responsabilidade individual e responsabilidade da pessoa jurídica, devendo, neste último caso, serem avizinhados certos pressupostos.

4.1. Responsabilidade penal individual

A prática de um fato punível era, até pouco tempo, atribuída apenas ao indivíduo, ao ser humano, pessoa física, como sujeito ativo do crime. Isso porque a imputabilidade exige a plena capacidade do autor para a prática do caráter ilícito do fato e de estar ele determinado à prática, o que, por óbvio, por ser o único capaz de dirigir finalisticamente sua conduta, é característico do ser humano, fato que, inclusive, configura um impedimento, para muitos, do fato de a lei penal voltar-se, em termos de sanção, à Pessoa Jurídica. Como a responsabilidade penal individual é a tônica da dogmática penal tradicional, as atenções deverão estar voltadas à responsabilidade da pessoa jurídica, o que, doravante, nos limites e propósitos do texto, será abordada.

4.2. Responsabilidade penal da pessoa jurídica

Na Lei 9.605/98, cumprindo o mandamento constitucional, o legislador brasileiro vence a barreira da inalterabilidade e passa a dispor literalmente, no artigo 3º, caput, o seguinte “As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente […] nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade(grifamos). Como se nota, a intenção do legislador foi punir o “verdadeiro” criminoso em matéria ambiental, já que a pessoa física que comete o crime ambiental está, de certa forma, ligada a uma organização empresária, cuja finalidade é a realização do evento produtivo em busca do resultado lucrativo da atividade desenvolvida. Por vezes, o próprio Estado atua como um dos atores, por decorrência de obras e serviços que, eventualmente, venham a ser por ele perpetrados em prejuízo do meio ambiente.

Segundo o disposto no parágrafo único do referido artigo 3º, a lei não exclui a responsabilidade das pessoas físicas na prática delituosa perpetrada pela pessoa jurídica contra o meio ambiente. Em nível legislativo, portanto, a pessoa física não se exime de responsabilidade penal, mormente porque atua, e somente ela, com elemento subjetivo próprio, dolo ou culpa.

É de suma importância destacar que a responsabilidade penal da pessoa jurídica vem ganhando corpo nos julgados dos tribunais brasileiros, o que tem contribuído para a consolidação de uma nova e interessante forma de tutela integral do meio ambiente pelo direito penal: aquela que se faz presente ainda quando o autor do dano for pessoa não dotada, per si, de condições de agir, mas que, em verdade, por sua maior estrutura, possui um maior potencial lesivo e, em contrapartida, de reparar o dano causado.

Essa realidade, ainda incipiente no ordenamento pátrio,

ya se ha visto al reconocer, en la mayoría de las legislaciones mundiales y en casi todas las de América Latina, la responsabilidad penal de la persona jurídica […] Por su mayor poder económico tienen más capacidad para modificar o destruir mayor cantidad de recursos naturales renovables que las personas naturales y su posibilidad económica de pagar investigaciones y tecnología, les permite sacar el máximo provecho de los recursos naturales en forma indiscriminada. Este punto ha traído discusiones y debates, los cuales necesariamente serán diferentes a la tradicional discusión acerca de la imposibilidad de aplicar las penas corporales a las personas morales pues, otro tipo de medidas se hace necesario en lo tocante al ambiente y son erfectamente aplicables, y preferiblemente aplicables, a las personas jurídicas, como el cierre de fábricas y otras (POZO, 2014, online).

E, no direito americano, ganha um papel cada vez mais destacado na tutela penal, consoante revela Samuel W. Buell:

Application of the doctrine of entity criminal liability, which had only a thin tortlike rationale at inception, now sometimes instantiates a social practice of blaming institutions. Examining that social practice can ameliorate persistent controversy over entity liability’s place in the criminal law. An organization’s role in its agent’s bad act is often evaluated with a moral slant characteristic of judgments of criminality and with inquiry into whether the institution qua institution contributed to the agent’s wrong. Legal process, by lending clarity and authority, enhances the communicative impact, in the form of reputational effects, of blaming an institution for a wrong. Reputational effects can flow through to individuals in ways that reduce probability of future wrongdoing by altering individual preferences and forcing reevaluation and reform of institutional arrangements. Blame and utility are closely connected here: the impulse to blame organizations and the beneficial effects of doing so both appear to depend on the degree of institutional influence on the agent. (BUELL, 2014, online).

De se destacar que, consoante o disposto no caput do artigo 3º da Lei 9605/98, a responsabilidade penal da pessoa jurídica fica condicionada a que a infração tenha sido cometida em seu interesse ou benefício, por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, e, implicitamente, que a ação tenha ocorrido no âmbito das atividades da empresa.

A responsabilização penal deve ser condicionada à existência de dolo, cujo aferimento é novidade para os órgãos da justiça e segurança, levando o processo investigativo no sentido de apurar, objetivamente, os indícios de participação das instâncias decisórias da empresa, na conduta criminosa imputada. Todos os documentos devem ser considerados na busca dos elementos de culpa da empresa nos delitos penais (LANFREDI, 2006 p. 103).

Como decorrência lógica do exposto no art. 3º da Lei 9.605/98, não há como se defender a punição da Pessoa Jurídica a título culposo. Isso porque uma vez que o domínio do fato se encontra com as pessoas físicas que detêm capacidade diretiva da empresa, e se não existe tal domínio sem o dolo, entendido como vontade livre e consciente de praticar atos que compõem o tipo legal, as pessoas jurídicas só podem ser responsabilizadas pela prática de crimes dolosos. (MILARÉ, 2011 p. 1293).

Questão interessante é a da exigência, para fins de responsabilização da pessoa jurídica, de concomitante imputação dos fatos à pessoa física. Trata-se da análise da necessidade de concurso de agentes no crime entre a pessoa física e a pessoa jurídica.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, há muito, por força da redação legal empreendida pela lei ambiental de 1998, tem decidido ser possível a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais, desde que haja a imputação simultânea do ente moral e da pessoa natural que atua em seu nome ou em seu benefício. Nesse sentido foi a decisão exarada em 20 de outubro de 2011 pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, em sede de Embargos no Recurso Especial n. 865.864/PR, de relatoria do Ministro Adilson Vieira Macabu, decisão esta que revela entendimento há muito reinante no STJ.

Todavia, em 6 de agosto de 2013, no julgamento do Recurso Extraordinário 548181/PR, de relatoria da eminente Ministra Rosa Weber, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal entendeu, por maioria, pela admissibilidade da condenação de pessoa jurídica pela prática de crime ambiental, ainda que absolvidos os representantes legais. Em suma, o Tribunal Constitucional, inaugurando novo posicionamento jurisprudencial acerca do tema, entendeu que a Constituição Federal, na proteção do ambiental, não fez qualquer exigência de concurso necessário entre pessoas físicas e jurídicas para fins de responsabilização destas.

Noutra senda, questão que se apresenta ainda tormentosa, como se o próprio tema da responsabilidade da pessoa jurídica em geral já não o fosse, é a possibilidade de aplicação de sanção penal à pessoa jurídica de direito público. E sobre isso, duas correntes há muito já se destacam: a primeira, que entende não ser possível, escuda-se no argumento de que nunca um ente público pode ter como interesse uma conduta criminosa, e nem mesmo dela beneficiar-se, já que se submete aos princípios constitucionais da legalidade, moralidade e eficiência, sendo a supremacia do interesse público um norte não vinculado à prática de crime (MILARÉ, 1999, p. 101). A segunda, no entanto, trabalha a ideia da possibilidade, com o argumento de que a lei não restringe a sujeição ativa e que seria inconcebível blindar o Estado de praticar ilícitos. Se o Estado tributa a si próprio, por que não poderia punir–se? (BACIGALUPO, 1998, p. 374; GOMES; MACIEL, 2011, p. 49).

5 – INTERVENÇÃO MÍNIMA DO DIREITO PENAL

Num Estado que se proclama Democrático de Direito, a intervenção mínima do direito penal é questão de suma relevância, já que, como medida mais drástica de pacificação social, sua intervenção somente deve ser reclamada quando os demais ramos do direito não forem suficientemente capazes de salvaguardar o importante bem jurídico da não menos importante gravidade da lesão.

A referida tese, no entanto, parece contradizer o que alhures foi dito acerca do expansionismo penal de Silva Sánchez (2011, p. 28). Todavia, o fato de se reclamar a intervenção do direito penal em matéria ambiental condiz com a suprema importância do bem jurídico tutelado, não apenas para as presentes gerações que reclamam a necessidade de que as políticas desenvolvimentistas sejam sustentáveis do ponto de vista do equilíbrio ambiental, mas também para a própria existência das futuras gerações.

A grande demanda pelo direito penal em uma sociedade cada vez mais consumeirista de proteção em tese alcançada pela ameaça de pena não pode, todavia, acreditar que o direito penal possa vir a ser a panaceia capaz de atender demandas que, pela pouca importância do bem jurídico tutelado, ou mesmo pela insignificante ofensa ao bem, tenham por sede tipos penais incriminadores.

A intervenção mínima como princípio fundamental e secular do direito penal, ao contrário de argumentos que possam nele depositar uma ideia de fracasso ou de impotência, lança suas luzes ou o seu próprio cajado para o fortalecimento do objeto de tutela penal que, no caso, é o meio ambiente, hoje tão reclamado e tão castigado.

Como destaca Figueiredo Dias (2014), não há que se recusar ao direito penal o papel fundamental de tutelar o meio ambiente como bem jurídico de elevada estirpe; todavia, não há razão para depositar nele as esperanças na tutela da resolução de todos os problemas, pois, afinal, longe está de ter qualquer pretensão nesse sentido. Nas palavras do ilustre autor português,

há que conferir a outros ramos de direito a tarefa de oferecer às gerações vindouras hipóteses acrescidas de subsistência e de progresso. Logo ao direito civil, muito mais indulgente que o direito penal na aferição da responsabilidade e muito menos exigente na sua individualização; e de resto, como direito privado, particularmente adequado ao tratamento de questões que, na sua grande maioria, emergem do «mercado» e têm nele a sua origem. Mas sobretudo ao direito administrativo – porventura intensificado na sua vertente sancionatória, em nome de um Interventionsrecht –, a quem cabe por excelência, dada a sua natureza de braço executivo da própria Administração, a ponderação de milhares e milhares de situações conflitantes entre os interesses mais vitais da sociedade e os legítimos interesses dos administrados; e que por isso estará em posição inigualável para levar a cabo uma política de prevenção dos riscos globais.

Não negarei o papel fundamental – e em certas situações insubstituível – que a estes ramos de direito deve conferir-se na tentativa de resolução do problema. Mas julgo infundado o propósito de com eles esgotar o papel que ao Direito cabe na matéria; e, sobretudo, de com eles indiscutível que a força conformadora dos comportamentos do direito civil e do direito administrativo é menor do que a do direito penal; como menor é, por isso, a força estabilizadora das expectativas comunitárias na manutenção da validade da norma violada, neste sentido, a sua força preventiva ou, mais especificamente, de «prevenção geral positiva ou de integração» Este é o fundamento último da máxima – liberal, mas simultaneamente social – da intervenção jurídico – penal como intervenção de ultima ratio. Ao que acresce que já não na prevenção, mas na repressão das violações ocorridas tanto a intervenção jurídico-civil, como a jurídico-administrativa surgirão as mais das vezes como desajustadas, se não mesmo inúteis. E se assim é, então esta incapacidade (ou menor capacidade) de sancionamento do direito civil e do direito administrativo reflecte-se prognosticamente, com força potenciada, sobre o efeito preventivo da norma editada e acaba por aniquilá-lo. Tanto basta, se bem cuido, para que não possa esperar-se que por estas vias viesse a lograr-se uma mais efectiva protecção das gerações vindouras. Assim, pois, ao direito penal não pode negar-se a sua quota-parte de legitimação (e de responsabilidade) na protecção das gerações futuras. Reconhecê-lo, porém, implica que vejamos com a justeza e a modéstia possíveis o que dele pode e deve esperar-se. (DIAS, 2014, online).

Daí assegurar que pelo princípio elencado o direito penal propõe renunciar às intervenções em comportamentos de menor importância, cujas ofensas podem ser solucionadas no campo administrativo.

No Brasil, no entanto, o que se observa é que a Lei 9605/98 possui 41 tipos penais incriminadores e apenas 6 infrações administrativas. Para quase todas as infrações penais, as penas máximas cominadas não excedem a 4 anos (art. 50-A), ou, apenas no caso do artigo 69-A, a 6 anos de reclusão. Assim, não obstante a enorme gama de atribuições que deve competir ao direito penal em face da própria importância do bem jurídico tutelado, várias das infrações penais previstas na referida lei não deveriam encontrar nele uma sede adequada.

Embora possa parecer contraditório, a referência à intervenção mínima e à própria Lei 9605/98 ilustra que o Brasil, pelo menos em termos de consciência da sede penal para a resolução de alguns problemas ambientais, caminhou e caminha bem. Malgrado existam dificuldades dogmáticas relacionadas ao tema da proteção ambiental, não se pode olvidar que

el Derecho Penal no puede anquilosarse en un mundo en permanente cambio, por el contrario, debe responder a sus necesidades, como de hecho, lo ha venido haciendo en otros dominios. En la adopción de medidas diferentes cuyos efectos recaigan sobre el objeto del daño y no sobre el causante del daño, está el futuro del Derecho del Ambiente, pues la simple transposición de las soluciones del daño general al daño ecológico se reveló insuficiente.

A un nuevo daño corresponden nuevas soluciones. Es necesario respetar la especificidad del problema ambiental creando las normas adecuadas y que se correspondan con la evolución del Derecho Ambiental (POZO, 2014, online).

6 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exponencial aumento da sociedade consumeirista do direito penal que reclama um seu expansionismo capaz de frear as grandes catástrofes e os grandes problemas econômicos que geraram e ainda podem vir a gerar danos ambientais de grandes proporções, o direito penal, embora celeiro, tradicionalmente, de tipos penais que tutelam bens jurídicos da mais elevada estirpe contra as maiores e mais graves ofensas, vem revelando certo distanciamento de princípios que, classicamente, sempre moldaram suas intervenções.

Assim é que o expansionismo gerado pela maior demanda de penas exigida pela população em geral tem proporcionado a confecção de tipos penais que, quanto à sua conformação, têm tutelado condutas cuja periculosidade é meramente indiciária e que, enquanto pertencentes a um direito penal menos indulgente quanto às formas menos taxativas de descrição da ação ou omissão incriminadora, colocam em xeque a sua própria efetividade na resolução das questões a ele entregues.

Todavia, se o expansionismo acaba por gerar, por um lado, certo distanciamento do direito penal da chamada sociedade pós-industrial do risco, por outro, acaba por reconhecer nele um ente importante o bastante para ser celeiro de grandes e atuais demandas, dentre as quais a tutela do ambiente.

Se não pode ser propósito da intervenção penal alcançar a proteção dos riscos globais como um todo, é dele também o problema de ordenação social que tem por propósito oferecer contribuição para que os riscos se mantenham em níveis suportáveis de apresentação de forma a que não sejam colocados em xeque os fundamentos naturais da vida (DIAS, 2014, online).

Apresenta-se, no texto, um ensaio sobre a importância do direito penal na tutela ambiental, o que, também e de outra forma, significa o reconhecimento acerca da importância que o bem jurídico meio ambiente tem enquanto necessário para a vida humana, de vegetais e animais como um todo, com vistas à sobrevivência das presentes e à própria existência das futuras gerações.

Se dificuldades dogmáticas existem e assim foram pontuadas quanto à norma penal ambiental, quanto à responsabilidade penal das pessoas jurídicas e quanto à correta compreensão da intervenção mínima do direito penal, certo é que a dogmática é que deve servir à vida e não o contrário. O aproveitamento racional dos recursos naturais é questão imperiosa, que exige, em sua defesa, atos efetivos de império, somente alcançáveis mediante a adequada e necessária intervenção penal.

 Pier Giorgio Senesi Filho é Mestre em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela Escola Superior Dom Helder Câmara. Especialista em Advocacia Cível pela Fundação Getúlio Vargas, Advogado.  

 Luiz Gustavo Gonçalves Ribeiro é Mestre e Doutor em Ciências Penais pela UFMG. Professor dos cursos de graduação em Direito e de Mestrado em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável da Escola Superior Dom Helder Câmara – ESDHC. Promotor de Justiça em Belo Horizonte/MG.  

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NOTAS

1. Disponivel em: Acesso em: 22 nov. 2014.  

2. “A sociedade industrial pós-industrial é, além da ‘sociedade de risco’ tecnológico, uma sociedade com outras características individualizadoras que contribuem à sua caracterização como uma sociedade de ‘objetiva’ insegurança. Desde logo, deve ficar claro que o emprego de meios técnicos, a comercialização de produtos ou a utilização de substâncias cujos possíveis efeitos nocivos são ainda desconhecidos e, em última análise, manifestar-se-ão anos depois da realização da conduta, introduzem um importante fator de incerteza na vida social. O cidadão anônimo diz: ‘Estão nos matando, mas não conseguimos ainda saber com certeza nem quem, nem como, nem a que ritmo’”. (SILVA SÁNCHEZ, 2011, p. 37).  

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